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Mensagem: O REVÓLVER Silio Jader Embora com seis anos em 1942 já frequentava, informalmente, o primeiro ano escolar em Marambainha onde então residíamos. Vila perdida nos matagais do norte de minas, aonde só era possível chegar a cavalo ou a pé, era tão esquecida e pequena, uma única rua, que melhor seria chamá-la de lugarejo, povoado, roça ou equivalente. Morar ali era, literalmente, sobreviver. A nossa escola, um precário galpão no meio do mato, sem vivalma nas proximidades, não dispunha de qualquer tipo de instalação. Naqueles cafundós nem se sabia o que era energia elétrica, água encanada, saneamento básico e além disso nem farmácia havia. Na escola as necessidades fisiológicas, urinar por exemplo, eram feitas, quer fosse aluno ou aluna, no matagal próximo. Dona Marta, a professora, autorizava a ausência, avisava para não demorar , e ali atrás de uma touceira resolvia-se o problema. Um folha, ao alcance da mão, possivelmente, de mamona, desempenhava as funções de papel higiênico. Lavar as mãos nunca. Não havia água. Embora eu não estivesse acostumado a possuir brinquedos, devido à nossa situação de pobreza, eu dispunha de um velho revólver que estourava espoletas, com pequenos estalidos, gasto e mal acabado, mas que ainda funcionava. Interessado em obter algum dinheiro, resolvi vendê-lo e ofereci aos colegas de classe. Acabei encontrando um interessado em comprá-lo e com ele combinei que levaria na próxima aula para ser examinado. Levei e, com a peça bem escondida, tratei de sentar ao lado do interessado na compra e, sorrateiramente, passei-lhe a ´arma´ . Dona Marta não viu nada e o pretenso comprador pediu-lhe, e foi atendido, para ir lá fora satisfazer necessidade inadiável. Disse estar muito ´apertado´ . Pretendia estourar três ou quatro espoletas para verificar o bom funcionamento . Demorou, e demorou tanto, a ponto da professora interrogar-nos se sabíamos a razão de tanta demora. A maioria mentiu que nada sabia , inclusive eu, mas apareceu alguém que, meio baixinho e gaguejando, talvez com vergonha da traição, explicou que o colega tinha ido experimentar um revólver que eu tinha levado para vender-lhe. Ante o grande susto de Dona Marta , que arregalou os olhos o tanto que pôde, acrescentou rapidamente tratar-se de uma arma de brinquedo. Ela tranquilizou-se mas não deixou, com um rabo de olho, de verificar se a palmatória estava no lugar de sempre. Pois não é que ela estava? Claro! Só saía de lá para ´trabalhar´. Como havia trabalho à vista, estava prontinha. Olhei para o instrumento pendurado e ele pareceu que tinha criado vida, parecia rir e com olhar taxativo afirmava: chegou a hora moleque. Não adianta dessa você não escapa. O Arnaldo, era seu nome, entrou ressabiado. Percebeu alguma coisa no ar e parou estático e sobressaltado. Parecia tremer. Perguntado, e sob pressão, sentia que a situação estava preta e logo se entregou. Tinha ido experimentar o brinquedo. Tentou tergiversar e desconversou. Estava muito bom estourou todas as espoletas disse. Dona Marta não caiu no jogo. Sequestrou o revólver, examinou bem, puxou o gatilho, sem a munição (espoleta) e chamou-nos, eu e Arnaldo, à frente da classe. Debulhou, cheia de trejeitos, um sermão sobre o mal das armas de fogo, sobre o mentira, sobre a escola que era lugar de aprender e não de brincar, mandou-nos esticar os braços com a palma das mãos voltada para cima e a palmatória cantou. Tomamos os chamados bolos nas duas mãos , compassados mas ininterruptos. Não sei quantos mas sei que doeram e muito. Na mesma tarde nossos pais foram procurados e aprovaram totalmente o castigo já que no entendimento deles e da época, era missão da professora usar todos os recursos à sua mão para corrigir e educar. Até bater. Ficaram pois muito agradecidos a Dona Marta pela efetiva ajuda em prol de nossa educação. Pareceu-me que chegaram a encantar com a competência dela. Aquilo é que era ensinar o mais é conversa! Afirmavam eles. Meu pai não deixou de conferir se as palmas de minhas mãos estavam vermelhas . Estavam sim. Se não estivessem a lição não teria sido aprendida. Pensava ele. Refletindo agora tento entender: ´naquele tempo a professora batia nos alunos e, os pais bem como a sociedade, aplaudiam. Hoje os alunos batem e até atiram na professora e os pais e o sociedade nada fazem e até justificam o fato´. O que mudou? Alguém me confidenciou: ´não se faz mais professora como antigamente, nem aluno´ e completou com um risadinha irônica. Silio Jader Noronha Brito é Autodidata
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