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Mensagem: SEXÓLOGA DE ARAQUE Eu devia ter uns 10 anos, Pat e Fred eram dois e um ano mais velhos, e os outros quatro irmãos menores, Marquim, Mônica, Paulim e Márcia, vinham numa escadinha com degraus de um ano e três meses de diferença. Éramos sete. A oitava cria, Bertha, a rapa do tacho, só viria ao mundo dois anos depois, em 67. A casa era um alvoroço, correria e estripulia o dia inteiro. Meninos por todos os lados, os de casa e mais a molecada vizinha. Quando a aprontação estava demais, mamãe perdia a paciência, dava um basta, a garotada saía de fininho, ela então nos colocava de castigo ou nos dava uma sova. Na verdade sovinha, pois a dúzia de bolos nas mãos era aplicada com uma indolor sandália de borracha. De vez em quando, para amainar os agitos, ela nos levava para a sala e lia algum livro. Era a maneira de ficarmos sossegados. Lembro-me das poesias de Manoel Bandeira, algumas sensuais. Eu achava estranho mamãe ler aquelas coisas indecentes: Teu corpo claro e perfeito Teu corpo de maravilha Quero possuí-lo no leito Estreito da redondilha... Aquela leitura sugestiva e caliente despertava a libido dos machinhos, direcionando-os para o banheiro. Ali, a contumaz demora fazia com que mamãe batesse à porta pedindo pressa. Muitas vezes pedia pra gente tomar banho de porta aberta, com o que Marão não concordava e dizia: - Maria, deixe os meninos tomarem banho sossegados. E com a porta fechada, se assim quiserem. - Desse jeito não dá, Mário, eles ficam horas debaixo do chuveiro e ainda saem sem tomar banho direito. - Maria, largue os meninos, são os hormônios da puberdade. Se apertar o braço de um deles, hormônios espirram igual sumo da casca de laranja. É da idade. Relaxe. - Mário, só você conversando com seus filhos. Você, como médico, podia muito bem dar uma aula de iniciação sexual pra eles. Ontem, Mônica me perguntou como os bebês entram na barriga da mãe... Semana passada, Paulim veio com o calção arriado me questionar: - Olha, mamãe, meu pipi tá duro! Tem um osso aqui dentro? Por seu turno, Marão se esquivava, tirava o corpo fora, alegava que não tinha tempo, nem jeito, e que mamãe mesmo reunisse a tchurma e desse uma aula. Pois bem, lá foi a coitada da Maria Jacy comprar livros, enciclopédia, tomar revistas emprestadas, ler tudo sobre o assunto, estudar, pesquisar e quando sentiu-se preparada, chamou a ninhada para uma conversa séria, legal e democrática. A data foi marcada com antecedência e a hora para depois do jantar. No dia aprazado, a molecada se empoleirou nos sofás e se esparramou pelo chão da biblioteca, barriga pra baixo, mão segurando o queixo, olhos brilhando e a cabeça a mil. Mamãe sentou-se bem à frente da gente, num sofá vermelho, cercada de sabedoria por todos os lados, mais a Barsa, livros, revistas e começou a aula que preparara com todo o zelo e tensão. Mesmo com certo gaguejo, explicou tudo, tudinho, ci-en-ti-fi-ca-men-te: sementinhas pra lá, óvulos pra cá, muito amor do papai e da mamãe, patati-patatá. Histórias de papai do céu e cegonhas bicudas não entraram na conversa. Deu para perceber que mamãe terminou a explanação suada, mas aliviada por ter cumprido a missão. A batalha, porém, estava apenas começando. Ao perguntar aos queridos anjinhos se haviam compreendido tudo, se queriam fazer alguma pergunta, Linka foi logo confessando: - Eu compreendi tudo, só não entendi aquele negócio que para ter filho tem que por um ´tênis´ na vagina. Mamãe quase caiu para trás: - Valha-me, Deus, como é que é? Fred, desde a infância didático e irônico, explicou: - É o seguinte, Paulim, quando coloca um Kichute, nasce menino; quando coloca um conga, nasce menina, entendeu? Dona Jacy, então, deu uma nova explicação científica para Paulim. Aos cochichos, Mônica, que estava ao meu lado, comentou com Pat: - Nossa, quer dizer que papai já fez isso com mamãe sete vezes? Ave Maria! A professora Jacy pediu silêncio e, em seguida, Márcia quis saber pra que servia modess. Mamãe foi ao quarto dela, apanhou um absorvente, vestiu-o por cima da roupa, explicou, explicou tudo bonitinho, ci-en-ti-fi-ca-men-te. Ao terminar, eu sussurrei pra Fred: - Não lhe falei,Fred, que Bertinho estava nos ensinando errado? Ele não sabe nada. Mamãe, apavorada, interferiu: - Como é que é? O que Bertinho lhes ensinou? Eu respondi, baixinho: - Bertinho nos falou que as mulheres usam modess quando fazem indecência com os homens. - Que é isso, menino, surpreendeu-se mamãe. E reviu o tópico “menstruação”. Para encerrar, com mamãe já exausta, balangandã, Quincas levantou o dedo para fazer sua pergunta. - Fala, Marquim, o que você quer saber? O filósofo mirim abriu o bico pela primeira vez na reunião: - Mamãe, nós só “queria” saber o que que é “rapariga”... Nocaute. A professora arriou no sofá vermelho. Rateou, rateou, tentou explicar, gaguejou, os livros e a enciclopédia não ajudavam em nada, e Dona Jacy jogou a toalha: - Meus filhos, por hoje já está bom demais, a pergunta de Marquim fica pra próxima aula. Estamos esperando até hoje a segunda aula. Viu, sexóloga de araque? Obs: Escrevi esta crônica em homenagem aos 87 anos do meu umbigo, que aniversaria hoje, 23/09/2016. À bênção e parabéns minha mãe.
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