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montesclaros.com - Ano 25 - sábado, 16 de novembro de 2024
 

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Mensagem: A Caixa de Bisa Tenho tentado, há dias, organizar o meu acervo fotográfico - uma grande caixa de papelão forrada de tecido adamascado. Aprendi a guardar assim as fotos com a prima Bisa – Maria Luiza Veloso Costa – amiga desde os dias de Montes Claros e vizinha aqui em BH, por muitos anos. Uma tarde pediu que fosse à sua casa. Já vinha adoentada e muito abatida pela perda dos irmãos Eduardo e Mário, falecidos no intervalo de uma única semana. Avisou que tomaríamos um café, sem pressa. Sua doença não a abatera fisicamente, me parecia ainda ter forças para resistir por algum tempo. Trouxe uma grande caixa florida, repleta de fotos que emanavam cheiro de antiguidades, e me pediu que tomasse conta delas. Pertenceram à sua Vó Nietta, irmã do meu avô José Versiani dos Anjos, e tinham sido guardadas pela sua mãe Elisa. Não queria que saíssem da família e sua hora estava próxima. Jamais vi alguém mencionar a própria morte com tanta calma, sem amargura. Disse que deixaria comigo aquelas fotos antigas e explicou que deveria entregar algumas às netas de tia Joaninha, outras aos primos Bruno e Flavio, filhos do tio Waldemar Versiani, e a Maria Beatriz Velloso de Menezes, casada com Ivo Porto de Menezes, filha do Dr. Carlos Augusto Versiani Velloso e de D. Nemita, e irmã mais nova de Maria de Lourdes*. Fiquei muda, quieta, e mergulhamos nas lembranças do passado, nosso tema predileto. Falou da morte do pai, o engenheiro montesclarense Joaquim Costa, que muito gostava de viver. Segundo mamãe, era em suas viagens para o Rio de Janeiro que ele aprendia as marchinhas de Carnaval. E, quando voltava, as ensinava aos amigos e às primas de Montes Claros em alegres reuniões. Cantavam entre outras: “Lourinha, lourinha Dos olhos claros de cristal Desta vez em vez da moreninha Serás a rainha do meu carnaval (bis) Loura boneca que vens de outra terra Que vem de Inglaterra Que vem de Paris...” Ou ainda: “Linda morena, morena Morena que me faz penar A lua cheia que tanto brilha Não brilha tanto quanto o teu olhar” Nos seus últimos dias, Joaquim Costa, sempre tão alegre, se entristeceu, ficou contrariado e se virou para a parede. Não querendo mais conversa, se entregou definitivamente. Tempos depois, sua mulher Elisa acordou à noite, queixando-se a Bisa de indisposição. Talvez o jantar estivesse lhe pesando. Bisa foi à cozinha, pôs um pouco de bicarbonato num copo d’água e, voltando ao quarto, encontrou a mãe agonizante. Recordamos também a magia da festa do centenário de Montes Claros, em julho de 1957. Bisa brilhou como sua rainha. O parque de exposições João Alencar Atayde havia sido inaugurado e à noite houve bailes memoráveis no Clube Montes Claros. Dançávamos até de madrugada, quase manhã, ao som dos conjuntos musicais trazidos do Rio de Janeiro e de Belo Horizonte. Todas nós tínhamos um primo como par constante. E o de Bisa era Martim Afonso, filho de Tio Cyro e Tia Lilita. O meu, Antônio Joaquim, irmão do primeiro. Passada a festa todas nós nos conformamos com a perda do par. Bisa ficou desolada, não havendo jeito de esquecer o namorado. Ajuizadamente, toda a família alertou para a existência de muitos casamentos consangüíneos entre nós. Então Bisa fez uma promessa: iria diariamente à missa da Matriz e comungaria até conseguir esquecer o primo. Rezou e rezou e a lembrança foi se apagando naturalmente. A dor da perda se amenizou. Um dia, fomos convidadas à sua casa e lá estava o jornalista Lincoln Prates Santos – um feioso adorável. O namoro foi muito estimulado e, logo depois do seu retorno a Belo Horizonte, deram início a uma longa correspondência. Naquele tempo não havia e-mails e não se usava, sem cerimônia, o telefone da família. Bisa punha no bloco de papel de linho suas ideias e, em seguida, a mãe Elisa corrigia sua escrita para evitar erros crassos, porque as cartas de Lincoln eram lindas, impecáveis! O casamento aconteceu no princípio de janeiro de 1961. Temos a foto, primas e amigas ao redor dela. Pena que não inclua seu irmão Cacá – Carlos Antônio Velloso Costa, muito belo, parecidíssimo com Marlon Brando. Por me faltar coragem, deixei passar alguns anos antes de cumprir o pedido. Ao fazê-lo agora, fui tocada por sua inesquecível presença de vitalidade e alegria. Descobri que meu coração, relicário de tantas lembranças de família, se transformou na caixa de Bisa. Iara Tribuzzi Outono de 2016 Família do Desembargador Antônio Augusto Veloso * Maria de Lourdes aparece no colo da mãe Dona Nemita Arthur Versiani Veloso é o último à direita, de pé

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